1. |
Silenciar em Paz
04:24
|
|||
silenciar em paz (Felipe Antunes)
acreditar
acreditar na paz
que a força dos teus olhos
me faz preencher
enquanto te observo sou silente
silenciar
silenciar em paz
e assim poder tocar
de ti fazer sentir
estarmos em silêncio é o som do corpo
do corpo teu
do corpo meu em paz
vibrando o mesmo passo
sentindo o mesmo gosto
daí mostrar-te às voltas nosso esforço
se esforçar
se esforçar na paz
é o tempo que se perde
fugindo da tormenta
e a lágrima de chuva não faz corte
lacrimejar
lacrimejar de paz
eu sei que às vezes arde
que a dúvida sustenta
mas toda carne queima enquanto viva
poder viver
poder viver em paz
e a única certeza
que faz mover-me em fase
é de mover-te junto a nos acreditar
acreditar
acreditar na paz
acreditar
Felipe Antunes: voz e violão
Tjalle Rens: violoncelo
|
||||
2. |
||||
pássaro estranho (Felipe Antunes)
às vezes penso que
me perdi no tempo
e pouco a pouco
me fiz de louco
pra suportar
que o tempo vai passar
e um dia vai parar pra nós
e nesse após
vou caminhar
pela memória
pra me curar
conto a história
aceito
o pouco que somos acabar
e quanto mais me ajeito
mais lembro o tanto que me engano
por tantos anos
quis me soltar
a cicatriz de dor
é o céu dizendo filho meu
seja o que é seu
vamos brindar
tome esse vento
pássaro estranho
me leve a tempo
de repousar
faça o que for
possível
diante do abismo
quero acordar
Felipe Antunes: voz e violão
Tjalle Rens: violoncelo
Participações
Lenna Bahule: voz
Fred Martins: violão
|
||||
3. |
Epidemia
09:29
|
|||
epidemia (Felipe Antunes)
a cidade toda suja
precisava renascer
foi chamado o diligente
forasteiro da TV
vacinando toda gente
vou tratar de florescer
em estado de piedade
vi famílias suplicarem
abismado foi sentindo
que era grave a situação
a cidade fora vítima
de uma rara contração
uma nova epidemia
que aclamava solução
implorava fortes gestos
talvez por internação
principiou muito adorado
fornecendo parecer
via putas na calçada
ordenava recolher
foi guardando pobres pretos
feministas pra aprender
pôs os padres tolerantes
junto às bichas e os drogados
a cidade foi ficando toda limpa dessa história
toda limpa de insurgência, toda açoite, toda glória
o passado se escorria, não havia mais tristeza
quem ficava em liberdade tinha acesso à natureza
mas o acesso vigiado, vasculhava competência
só poeta vacinado declamava em decadência
por fim, dentro de sua estafa, adormeceu
despertou certo de que havia criado uma antiloucura numa sociedade transpirante — e agora antitranspirante — e que precisava devolver a cadência às declamações, os suores às inspirações, as prostitutas aos relentos e relinchos, os cantores aos cabarés imundos, e os autônomos aos sucos de laranja que espremiam em suas esquinas proibidas
foi correndo atormentado
libertando de uma vez
toda gente que trancada
mal sabia o que comer
como porcos se embrenhavam
de ter medo de morrer
mas agora confiados
tinham voz pra rebater
foram em marcha organizados
procurar o que se crer
saquearam vacinados
vacinaram seus bebês
ele se pensava sano
já sentia enlouquecer
deu um tiro no prefeito
internou-se a se esconder
em pouco tempo tudo
escapava da memória
a cidade se contaminando foi
de uma epidemia nova
Felipe Antunes: voz e violão
Tjalle Rens: violoncelo
Participação
Marcelo Castilha: Acordeom
Almada Negreiros: Textos que introduzem e encerram a canção (trechos do Manifesto Anti-Dantas)
|
||||
4. |
Cru
03:58
|
|||
(Felipe Antunes)
cru
tarde demais
fica você
um olho cru
te faz cobrir
em adoração
peço mostrar
aberto em dor
faço-me entrar
faço-me entrar
aberto em dor
peço mostrar
em adoração
te faz cobrir
um olho cru
fica você
tarde demais
ao sagrá-lo sempre vale prosseguir
que no fundo todo mundo vai gozar
do momento, engolimento, exortação
falha o mundo, mas não falham fundo e vão
Felipe Antunes: voz e violão
Tjalle Rens: violoncelo
|
||||
5. |
||||
modelo guanabara
(Felipe Antunes / Jackeline Stefanski / Xis)
o transe do cavalo / o transe da cavala
a pata e o suor / a pata e o suor
a força do acossado / a força da acossada
o Deus raça maior / a Deusa (Adeus) raça maior
Ciata é nossa Tia
de santo a mãe falou
branca a fantasia
na casa do Sinhô
o negro é poesia
fetiche de patrão
matéria de pesquisa
viveiro-alçapão
assim disse Abdias
nascimento acabou
brinca-se alforria
na casa do Sinhô
colônia e propriedade
transcontinental
imóvel liberdade
de branco ou de avental
é curiosidade
pra peça de escritor
é oportunidade
(cadê o seu valor?) labor proprietário-otário-labor
salve Carolina
Jesus do Criador
Teresa de Benguela
Mahin Luisa Flor
brinda-se alforria
pro negro que aguentou
o transe do cavalo / o transe da cavala
a pata e o suor / a pata e o suor
a força do acossado / a força da acossada
o Deus raça maior / a Deusa (Adeus) raça maior
Em maio (Oswaldo de Camargo)
Já não há mais razão para chamar as lembranças
e mostrá-las ao povo
em maio.
Em maio sopram ventos desatados
por mãos de mando, turvam o sentido
do que sonhamos.
Em maio uma tal senhora Liberdade se alvoroça
e desce às praças das bocas entreabertas
e começa:
"Outrora, nas senzalas, os senhores..."
Mas a Liberdade que desce às praças
nos meados de maio,
pedindo rumores,
é uma senhora esquálida, seca, desvalida
e nada sabe de nossa vida.
A Liberdade que sei é uma menina sem jeito,
vem montada no ombro dos moleques
ou se esconde
no peito, em fogo, dos que jamais irão
à praça.
Na praça, a Esperança se encolhe
ante o grito "Ó bendita Liberdade!”
E esta sorri, e se orgulha, de verdade,
do muito que tem feito...
Felipe Antunes: voz
Tjalle Rens (Holanda): violoncelo
Participações
Oswaldo de Camargo (Brasil): voz
Xis (Brasil): voz
Nastio Mosquito (Angola): voz
Kika (Brasil): voz
Lenna Bahule (Moçambique): voz
Fred Martins (Brasil): violão
Maria Eugênia Cirino Cardoso (tia Geni): introdução - Cantiga popular de lavoura
|
||||
6. |
Super-Homem - A Canção
04:27
|
|||
Super-Homem — a canção (Gilberto Gil)
um dia
vivi a ilusão de que ser homem bastaria
que o mundo masculino tudo me daria
do que eu quisesse ter
que nada
minha porção mulher, que até então se resguardara,
é a porção melhor que trago em mim agora
é a que me faz viver
quem dera
pudesse todo homem compreender, oh, mãe, quem dera
ser o verão o apogeu da primavera
e só por ela ser
quem sabe
o Super-Homem venha nos restituir a glória
mudando como um Deus o curso da História
por causa da mulher
Felipe Antunes: voz e violão
Participação
Leonardo Mendes: violão
|
||||
7. |
Espelhos
03:32
|
|||
espelhos (Felipe Antunes / Jackeline Stefanski)
eu queria poder não chorar
pra que chorar se tudo está sempre em transformação?
digo isso pois sei me apegar
e o nosso estado é complicado à sombra da razão
a vida vai romper na morte que afinal vou ter
um fio d'água teima em cair
e pela face um vitral de espelhos força se espalhar
o tempo e a razão, de tanta imensidão, vão ser engano
não tem
tristeza
que aguente
a certeza
eu perco o medo
eu mudo
pra não
emudecer
eu queria só poder chorar
porque chorar é como estar sempre em transformação
o sangue estanque entre o céu da boca e a garganta!
um sopro, um gole, pobre coração
no fundo, acende, apaga e aceita a condição
Felipe Antunes: voz e violão
Tjalle Rens: violoncelo
|
||||
8. |
Notícias (ft. Kika)
02:56
|
|||
notícias (Felipe Antunes)
quanta gente vai ter que engolir
quanta gente nem vai se abalar
quanta história vai chegando ao fim
quantos fins que nem vão começar
se a gente já não vai sorrir
que motivo pra poder chorar
e eu já li em algum lugar
e eu já sei por onde começar
eu nunca soube como me cuidar
mas aprendi pra poder te ensinar
não é isso que você pediu
e é por isso que eu quero te dar
eu não sabia que era assim
e não tive tempo de me informar
você disse pra eu me cuidar
e agora reza pra poder me ver
nem sei bem em que lugar estou
e tenho pena de quem me encontrar
será que é isso esse outro lugar?
será que é tudo que eu mereci?
ainda não te encontrei
mas eu não canso de te procurar
não é isso e a gente combinou
ir embora pro mesmo lugar
ainda vou te procurar
meu telefone eu também perdi
mande notícia pra qualquer lugar
diz pros pais já pode descansar
e era isso que eu te prometi
só isso não pude lembrar
Felipe Antunes: voz e harmônio
Tjalle Rens: violoncelo
Participação
Kika: voz
|
Felipe Antunes São Paulo, Brazil
Musician, singer, songwriter and researcher with three Latin Grammy and one Shell`s Theater Prize nominations. Graduated and postdoctoral in Materials Science and Engineering. Has recent artistic collaborations with artists from Angola, Argentina, Cabo Verde, Netherlands, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, etc. ... more
Streaming and Download help
Felipe Antunes recommends:
If you like Felipe Antunes, you may also like:
Bandcamp Daily your guide to the world of Bandcamp